TERRITÓRIOS DE TRANSIÇÃO #11 – A Experiência do Silêncio

TERRITÓRIOS DE TRANSIÇÃO #11 – A Experiência do Silêncio
June 6, 2013 admin

TERRITÓRIOS DE TRANSIÇÃO #11 – A Experiência do Silêncio

06.06.13|19.09.13
BES ARTE E FINANÇA, Lisbon, Portugal

Obras das Coleções: BESart | O MUSEU TEMPORÁRIO

Artistas Participantes:

Helena Almeida, Dieter Appelt, Daniel Blaufuks, Christian Boltanski, Rui Calçada Bastos, Luís Campos, Hannah Collins, Tacita Dean, Hamish Fulton, Rodney Graham, Thomas Joshua Cooper, Sherrie Levine, Craigie Horsfield , Eurico Lino do Vale, João Louro , Cindy Sherman, Vera Lutter, Jorge Molder, Abelardo Morell, Thomas Struth, Júlia Ventura.

 

1. INTRODUÇÃO:

Esta exposição reúne obras de duas coleções de fotografia contemporânea: a coleção do Banco Espírito Santo [BESart], uma reconhecida e reputada coleção que, tendo começado em 2004, conta hoje com mais de “novecentas obras de mais de duzentos e oitenta artistas de trinta e oito nacionalidades” que está acessível ao público através de exposições temporárias num espaço no centro de Lisboa [Marquês de Pombal]; e a coleção d’O Museu Temporário [Coleção OMT] que, desde 2001, iniciou a publicação de fotoportfólios de artistas contemporâneos de modo a proporcionar aos artistas convidados a edição de corpos de trabalho de qualidade significativa, sendo apresentada em espaços temporários de confirmado renome e que acolhe, em depósito, obras da Coleção [Safira & Luís] Serpa e da Galeria Luís Serpa Projectos.

Selecionadas apenas algumas das obras das referidas coleções, elas constituem um núcleo expressivo da criação contemporânea, tanto nacional como internacional e convergem na opção estética dos seus possuidores, razão pela qual se apresentam conjuntamente.

A exposição reúne obras que abordam temas como a “subjetividade da fotografia, o regresso ao realismo (fotográfico) e a relação entre a fotografia (enquanto prática teórica e conceptual) e a estética em geral”. Baseada numa significativa diversidade de obras, a seleção recaiu apenas num número restrito de obras a preto-e-branco, facilitando a leitura de abordagens teóricas que estão na base da construção do conceito do Silêncio enquanto substantivo. Enfatizando as experiências variadas de cada um dos artistas participantes, as leituras e as ligações efetuadas através da análise das realidades urbanísticas, sociais, económicas e, neste caso, também psicanalíticas, enfrentam, no crescimento e desenvolvimento das cidades, experiências e visões que completam a diversidade de estudos e reflexões sobre a geografia urbana, tanto ao nível da sua análise teórica como empírica.

 

2. A dificuldade de falarmos sobre o silêncio diz respeito ao “dizível” e ao “indizível, tanto ao nível psicológico e social como político e histórico. Em termos artísticos, procuramos encontrar obras que correspondam a narrativas pessoais e coletivas capazes de equacionar experiências que transformem e celebrem o diálogo entre os diversos olhares atribuindo-lhes uma importância essencial. Esse “olhar” é frequentemente elaborado no silêncio dos percursos percorridos pelos criadores que desvendam e transformam a(s) realidade(s) de cariz aparentemente banal em ficções e estórias que se constituem como territórios pessoais de geometria variável. Esta capacidade para ultrapassar a perceção do real é uma característica que «permite que o olhar do artista se institua como uma visão “autêntica” o que supõe um modo totalmente diferente de abordar essa realidade considerando-o mais como um observador do que um criador que opõe […] a “beleza” à “utilidade”» [J. Dewey], num apelo a uma crítica da aparência, contrariando o tema filosófico da ilusão. A arte é, de alguma forma, a “fotografia” da essência singular das coisas.

‘A Experiência do Silêncio’ reúne uma seleção de obras da Coleção do Banco Espírito Santo [BESart] e d’O Museu Temporário [Coleção OMT] e integra um ciclo de exposições sob o tema dos Territórios de Transição ou “Espaços Vazios”, entendidos como uma deriva na ilegibilidade da cidade contemporânea e das suas formas urbanas.

Da paisagem natural à urbana, dos universos públicos aos privados, das narrativas pessoais às coletivas, a experiência artística configura-se em múltiplas ficções que se completam e/ou se opõem às diversas realidades, incluindo espaços, lugares e memórias. Aborda, ainda, temas como a “subjetividade da fotografia, o regresso ao realismo (fotográfico) e a relação entre a fotografia (enquanto prática teórica e conceptual) e a estética em geral”.

 

#1. Território Como Paisagem

Ao utilizar o “passeio” como meio de capturar a essência do percurso e do itinerário, o artista confere um atributo à deslocação que diferencia a ação do nómada (que vagueia sem objetivo) com o intuito do peregrino (que se desloca com um princípio e um fim). Esta caminhada (silenciosa?) e este prazer em deslocar-se, permite distinguir uma “deslocação anónima” de uma “jornada estética” que é empreendida pela satisfação de se movimentar conseguindo ver, de modo diferente, aquilo que nós (não) vemos. O olhar do artista será, então, a apreensão da realidade através da ausência das convenções utilizadas que definem aquilo que observamos, proporcionando-nos uma realidade imaginada e atribuindo-lhe um significado.

Obras: T.J. Cooper, Rodney Graham

 

#2. Território[s], Fins e História[s

Os territórios desbravados pelos colonizadores deram origem a narrativas que utilizam a exploração, a cartografia e o mapeamento, a fronteira e o exílio. A literatura alimenta o nosso imaginário através da memória, identidade e diáspora que se assumem como elementos significantes dos discursos pós-coloniais. Se acrescentarmos a exploração, a imperialização (dos sentidos), o eurocentrismo e o etnocentrismo, então o léxico sobre os motivos e objetivos da colonização contribuem para uma clarificação dos modelos multiculturais e interculturais sobre os quais se baseou o mito da viagem. Hoje, a facilitação da deslocação através da evolução dos meios de transporte, da quebra de fronteiras e do desaparecimento do estado-nação possibilita uma maior mobilidade que permite à criação artística um vasto campo para a experiência transcultural, i.e., para uma desculturação voluntária da nossa identidade e do nosso eu face à alteridade do outro.

Obras: Tacita Dean, Vera Lutter, Daniel Blaufuks

 

#3. Território Enquanto Natureza Urbana

O Território é um espaço circunscrito e manipulado no qual se desenvolve a relação entre diversos grupos sociais, religiosos, profissionais, culturais, etc.. As ciências sociais elegeram-no como o “lugar” da espacialidade dos fenómenos e processos sociais e resgataram-no para que cumpra as funções de um espaço com (novas) funções específicas. A Natureza é, neste caso, utilizada como fonte de recursos e transformada de modo a ser requalificada; mas as distintas abordagens e as diversas representações que o Território adota nem sempre traduzem os modelos operativos que lhes estão na génese. Bem ao contrário da Natureza, o espaço urbano é um encontro das dinâmicas sociais e, portanto, de resistências não se assumindo nem com neutralidade nem imparcialidade.

Obras: Jorge Molder, Abelardo Morell, Thomas Struth

 

#4. Território, Ideias e Consciência

A apreensão das ideias e das narrativas pessoais «nem sempre passa pela mediação da linguagem, mas sim pela mediação do corpo». A dificuldade de falarmos sobre o silêncio diz respeito ao “dizível” e ao “indizível”, tanto ao nível psicológico e social como político e histórico. Em termos artísticos, estas obras correspondem a narrativas pessoais capazes de equacionar experiências que transformam e celebram o diálogo entre os diversos olhares atribuindo-lhes uma importância essencial. Elaborados no silêncio dos percursos percorridos desvendam e transformam a(s) realidade(s) de cariz aparentemente banal em ficções e estórias que se constituem como territórios pessoais de geometria variável. A consciência funciona como a capacidade de perceber a relação entre si, um ambiente e as coisas que a povoam. E a arte é, de alguma forma, a “fotografia” da essência singular dessas coisas.

Obras: Luís Campos, Cindy Sherman

 

#5. Território e CorpoMente

O Corpo é o reflexo daquilo que pensamos e que acolhe as mais variadas contradições e paradoxalidades. A Mente, como espaço de investigação seminal da filosofia, psicologia, ciências cognitivas e, até, da neurociência, continua a ser um mistério nos estudos sobre as psicopatologias a ela associada (depressão, ansiedade, stress, etc.). O prazer, a alegria e a tristeza, entre outros, são circunstâncias que derivam dos diversos estados de consciência abrigados no cérebro, um território em permanente mutação no qual não é possível encontrar o silêncio.  A melancolia, essa tristeza vaga e indefinida permanece, contudo, como um território que nos permite remeter para o inconsciente o sentimento de perda que teimamos em (não) esquecer no diálogo entre ego e superego.

Obras: Eurico Lino do Vale

 

#6. Território e Silenciamento

Os indivíduos ou grupos sociais que se constituem como comunidades segregadas criam relações distintas com outras sociedades e com o poder dominante.  A separação dos diferentes grupos sociais tem efeitos sobre o padrão de sociabilidade originando a acentuação de comportamentos de homogeneidade social. Os fatores de clivagem daí decorrentes, frequentemente enraizados na religião, nos valores e nas crenças políticas obrigam a um reconhecimento progressivo da singularidade e das aspirações de outras comunidades que habitam o mesmo território ultrapassando o silenciamento a que ficaram sujeitas. Estas situações, baseadas em valores que determinam as dinâmicas económicas e socio-culturais (ou a falta delas), tem constituído o tema de algumas práticas artísticas que se assumem como denúncia e/ou elo de ligação entre a realidade e as diversas identidades culturais, religiosas, ideológicas ou étnicas.

Obras: Boltanski, Helena Almeida, Júlia Ventura

 

#7. Território, Existência [Precária] e NãoEstável

O urbanismo e o planeamento urbano, por um lado, e a expansão rural, por outro, tem falhado as expetativas de conjugar progresso com sustentabilidade. Uma paisagem “aprisionada” não é necessariamente um território condenado face à evolução do crescimento e evolução das populações que o habitam; mas, silenciosamente, as “Catástrofes Naturais” [terramotos, maremotos, tempestades, incêndios, etc.], os “Acidentes Tecnológicos” [Chernobyl – 1995, Wall Street Crash – 1987, Buraco do Ozono, etc.] e os “Cataclismos Construídos” [Auschwitz – 1940/5, Hiroshima – 1945, 11 Setembro – 2001, etc.], associadas a tecnologias que contribuíram para a mutação entre o homem e o mundo que o envolve, deixam uma pegada ecológica que urge condicionar para precaver a exponencial existência precária destes territórios.

Obras: Hannah Collins, Rui Calçada Bastos, João Louro